Intervenção Federal na Varig
Publicado por Escritório Jorge Lobo em 08/08/2005
As sociedades anônimas de capital aberto, todas, sem exceção, especialmente as de grande porte (senão por seu valor de mercado, pelo menos pelo número de empregados e de clientes), com milhares de acionistas (minoritários, alijados do centro das decisões), produtoras de bens (de primeira necessidade) ou prestadoras de serviços (essenciais, por sua natureza e finalidade), devem ser objeto de rigorosa fiscalização e controle pelo Poder Judiciário, particularmente quando apresentam sucessivos déficits operacionais, atrasam salários, interrompem o recolhimento de impostos, deixam de pagar o REFIS, etc.
No Brasil, a Justiça, em casos particularíssimos e sempre em caráter excepcional, tem afastado diretores da gestão de companhias e nomeado administradores provisórios quando graves riscos podem vir a comprometer sua continuidade, em geral no âmbito de ações cautelares inominadas, eis que a Lei das Anônimas não prevê a intervenção judicial em sociedades abertas ou fechadas, nem mesmo quando iminente a falência, notória a insolvência, indiscutível a acefalia, flagrante o desentendimento entre acionistas e administradores, etc.
Exemplos marcantes da atuação profilática do Poder Judiciário em empresas em crise no país foram as intervenções: (a) no GRUPO CATAGUAZES, decretada pela Justiça Federal de Campos, em maio de 2003, devido ao descumprimento de termo de ajustamento de conduta, que poderia causar danos ao meio ambiente; (b) na BOMBRIL, em julho de 2003, em virtude do afastamento dos membros do conselho de administração, ligados à controladora italiana; (c) na CIRIO, controladora da BOMBRIL, e na PARMALAT, ambas em fevereiro de 2004, em que a Justiça designou administradores judiciais provisórios.
No Direito Comparado, todavia, e bem próximo de nós — na Argentina —, a intervenção judicial está, expressamente, contemplada em lei. De acordo com a Lei de Sociedades Comerciais argentina, quando os administradores de uma sociedade anônima, inclusive fechada, praticam atos ou incorrem em omissões, que criem situações de perigo grave, o acionista minoritário está legitimado a propor ação de destituição do administrador e a requerer a intervenção judicial, como medida cautelar.
Ao determinar a intervenção, o juiz nomeia um inspetor, um ou mais co-administradores e fixalhes as atribuições, em geral de levantamento de dados sobre a situação da empresa, em especial sua situação de caixa.
Como se vê, no Direito Comparado e em sábios precedentes de nossos tribunais, há sólidos fundamentos jurídicos para decretar-se a intervenção judicial na VARIG, que, segundo o jornal “O Globo”: (a) “atrasa salários mais uma vez”; (b) “para continuar em dia com o fornecimento de combustível, que consome 28% do faturamento, deixou de pagar os funcionários”; (c) “negou que esteja em atraso no REFIS”, após haver “renegociado em agosto do ano passado uma dívida de US$ 880 milhões com o Governo para pagamento em 15 anos” (ed. 03.04.04, pág. 33), e que, de acordo com o mesmo jornal, “só tem condições de voar até o fim da primeira quinzena de outubro e já teme que as empresas de leasing retomem os aviões por falta de pagamento” (ed. de 01.10.04, pág. 33).
Observe-se, contudo, por oportuno, que, se não há, no Direito positivo brasileiro, norma legal, expressa e categórica, legitimadora da intervenção judicial na VARIG, há, sem a menor sombra de dúvida, previsão, claríssima e taxativa, de intervenção federal, através do Comandante da Aeronáutica, nas “empresas concessionárias de serviços aéreos públicos”, conforme dispõem os arts. 188, caput e § 1º, c/c 289, caput e inc. V, do Código Brasileiro de Aeronáutica, e, por conseguinte, há a possibilidade, juridicamente indiscutível, de decretar-se a intervenção federal na VARIG.
Por que, como e quando se dá a intervenção em uma companhia aérea? O Código Brasileiro de Aeronáutica impõe a intervenção se a companhia aérea encontrar-se em crise administrativa, operacional, financeira ou econômica, através de decreto do Poder Executivo, quando há risco à continuidade dos serviços e à segurança do transporte aéreo, na esteira do Preâmbulo e dos objetivos da OACI, constantes do art. 44, da Convenção de Aviação Civil Internacional de Chicago de 1944, ratificada pelo Brasil. Para que, qual a finalidade precípua, qual o objetivo final da intervenção federal na companhia aérea em crise?
“O objetivo final da intervenção é recuperar a empresa e a normalidade dos serviços públicos”, doutrina o eminente José da Silva Pacheco, em seus excelentes Comentários ao Código Brasileiro de Aeronáutica, esclarecendo, ainda, que “o disposto no art. 188 constitui um avançado instrumento do instituto que, atualmente, fascina os estudiosos de direito empresarial, relativo à ‘recuperação ou soerguimento da empresa’” (RJ, Forense, 2001, 3a ed., p. 299). Destarte, ao invés de o Governo Federal e o Congresso Nacional empenharem-se em “entregar à GOL e à TAM as rotas nacionais” ou em “estatizar-se a companhia” ou “separar a VARIG em uma parte boa e uma parte podre” ou “deixar quebrar e licitar as rotas internacionais” (O Globo, ed. 01.10.04, pág. 33), porque não observar e cumprir a norma cogente do art. 188, caput, do Código Brasileiro de Aeronáutica, intervindo na VARIG, para zelar pela continuidade do serviço público de transporte aéreo de passageiros e cargas da maior companhia de aviação civil da América Latina e uma das maiores do mundo, com mais de setenta anos de existência de ótimos serviços, de renome internacional, que emprega 16.000 trabalhadores altamente qualificados, possui corpo técnico de escol, transporta mais de 15 milhões de passageiros por ano, com um faturamento anual de cerca de 8 bilhões de reais, mas que, lamentavelmente, como é voz corrente, não vem sendo bem administrada, conforme acentuou Joelmir Betting: “(…). A crise é de gestão e não de mercado, suspiram técnicos dos Ministérios da Defesa e do Desenvolvimento.”
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